Sinopse: Jim
Calegari é um jovem ilustrador que está prestes a realizar o trabalho que
impulsionará sua carreira, porém, estranhos acontecimentos o fazem questionar o
que é real e o que é ilusão. No limite de sua sanidade, apenas um investigador
de polícia parece ser capaz de ajudá-lo a sair da armadilha da qual se
envolveu.
Nota 1: Eu
perguntei o que as pessoas do meu perfil do Facebook gostariam de ler e algumas
das respostas que tive foram: suspense, terror, policial, alteração da
realidade pelo medo, ilustrador criando seres que ganham vida e mitologia
japonesa. Procurei juntar um pouco de cada coisa e criei esta história, com
algumas adaptações. Não sei ao certo se pode ser considerada uma história de
terror. Eu quis desenvolver o conto de uma maneira que os elementos não fossem
tão grotescos, mas um pouco mais sutis. Eu posso criar algumas histórias mais
“pesadas”, mas estou optando por não fazê-lo. O intuito aqui não é chocar com
imagens fortes e sim levar o leitor a um mundo estranho e enigmático. É mais
uma questão do estilo próprio que estou desenvolvendo, espero que entendam e
possam se divertir com a história mesmo assim. Muito obrigada a todos que colaboraram com o meu post!
Nota 2: O título
foi escolhido por votação no Facebook.
Notas 3:
Personagens usam linguagem informal, portanto, decidi não seguir todas as
regras gramaticais em diálogos.
Delírio em Grafite
Por Claudia Mina
“...................................................”
“.............................................Jim.”
Jim abriu os olhos e, mesmo acordado, sentia como se
estivesse num sonho. Parecia que havia uma voz que o chamava.
Um tanto desorientado, o rapaz levantou-se desajeitadamente
da cama. Havia uma claridade incomum no quarto e Jim notou que havia deixado a
luminária de sua mesa de trabalho acesa. O jovem caminhou até o local no
intuito de apagar a luz e sua atenção se voltou a uma folha de papel em branco.
Jim não se lembrava de tê-la deixado ali. Movido por uma força que o jovem
ilustrador não compreendia, ele sentou-se na cadeira em frente à mesa, pegou um
lápis e começou a esboçar formas de maneira solta. Não tinha nada em mente,
apenas deixou sua mão guiá-lo por traços que aos poucos foram ganhando vida.
Pouco tempo antes da alvorada, ele havia terminado o
desenho, e foi com surpresa que finalmente analisou o resultado do seu trabalho.
- Acho que esse é o melhor que já fiz – Jim disse a si
mesmo, ainda espantado.
No papel estava uma figura de extrema beleza, uma deusa de
cabelos longos e brancos, com refinadas vestes que se moviam com o vento e
cobriam boa parte do espaço da folha. Assemelhava-se com uma daquelas
ilustrações japonesas antigas, mas com traços marcantes do estilo próprio do
ilustrador. Jim Calegari fazia seu trabalho misturando técnicas tradicionais de
desenho e pintura, com as novas tecnologias digitais. O ilustrador achou o
resultado curioso, bem diferente do trabalho que estava fazendo para o seu
atual cliente. Pensava em como finalizar aquela ilustração, mas ela já parecia
gloriosa do jeito que estava. Resolveu deixá-la daquele jeito. Ele precisava
ter mais algumas horas de sono para poder trabalhar em um importante projeto
que seria a porta de entrada para trabalhos ainda maiores. Parecia que
finalmente seus anos de estudo e dedicação estavam prestes a dar-lhe frutos.
xxx
No dia seguinte, Jim acordou impressionantemente bem, apesar
das poucas horas de sono. Levantou e foi fazer o café como sempre fazia. A
comida, apesar de simples, parecia-lhe muito saborosa.
Ao se arrumar para sair, Jim podia sentir um cheiro
agradável no ar, algo que ele não conseguia identificar o que era ou de onde
vinha, era um aroma do qual ele nunca se lembrava de ter sentido.
Quando fechou a porta e pisou no pequeno quintal em frente a
sua casa, notou que havia pétalas de flores espalhadas pelo chão. Estranhou
aquilo, pois não tinha flores e nem os vizinhos mais próximos as tinham. Aquelas
pétalas deviam ter viajado muito com o vento ou alguém as havia jogado em seu
quintal. De qualquer forma, não era algo que o atrapalhasse tanto, mais tarde o
ilustrador as tiraria de lá, embora ele não sentisse tanta necessidade. Elas
eram diferentes, não pareciam com nenhuma flor que ele conhecesse e eram muito
bonitas. Com o vento, elas se moviam em ondulações pelo chão e subiam levemente
para depois cair delicadamente. Jim se viu estranhamente hipnotizado por elas
e, por um breve momento, teve dificuldade de sair de seu transe e continuar com
os afazeres do seu dia, até finalmente conseguir desviar seus olhos das
curiosas pétalas e sair.
xxx
Já era tarde quando voltou para casa. Jim tivera um dia
excelente, tudo se deu melhor do que ele esperava. O ilustrador sabia que devia aproveitar um
pouco de seu tempo naquele final de dia para trabalhar no seu projeto, mas o
que ele realmente queria era voltar na ilustração que havia feito na noite
passada. Comeu alguma coisa apressadamente e, logo que pôde, sentou-se à sua
mesa de trabalho. Admirou por um momento o que fizera e, de repente, colocou
uma nova folha em branco na mesa. Sem parar, ele começou a preencher o espaço
com traços e mais traços, até notar que havia desenhado aquela sua deusa do dia
anterior. No entanto, havia mais espaço na folha, que ele começou a preencher
como se estivesse em transe.
Horas depois, quando finalmente parou para olhar seu
trabalho, ficou surpreso ao notar que além de ter preenchido aquela primeira
folha, muitas outras haviam sido usadas. Sem se dar conta, ele começara um tipo
de história. Na primeira folha havia aquela deusa de cabelos brancos que ele já
havia desenhado antes, mas ao lado dela havia outro ser. A criatura se
assemelhava à primeira em complexidade e traços do mesmo exotismo fascinante,
mas em vez de cabelos brancos, tinha longos cabelos pretos com reflexos arroxeados,
vestes escuras e olhos de um azul profundo. Parecia ser algum tipo de entidade
superior pelo seu porte e seus trajes, provavelmente outro deus. No entanto, o
novo ser não transmitia o mesmo sentimento sublime de paz que a entidade
feminina emanava, ao olhá-lo, Jim sentiu-se mal, sua cabeça começou a latejar e
ele começou a escutar um irritante zumbido que ele não sabia de onde vinha. Sua
respiração ficou entrecortada e o rapaz foi tomado por uma espécie de
ansiedade, uma espécie de tormento. Mesmo assim, ele não conseguia desgrudar
seu olhar dos desenhos.
Como se em transe, acompanhou o seguimento da história que
havia criado. Na segunda folha, os dois deuses pareciam discutir; na próxima
folha, eles estavam no meio de uma briga violenta; na quarta e última folha, o
deus obscuro se sobrepunha à deusa e esmagava seu pescoço. Logo após ver a
última cena, Jim deixou a folha escapar de suas mãos. Estava abatido e assustado;
suor escorria pela sua pele e seu corpo tremia.
Jim tentou respirar fundo e foi com dificuldade que
conseguiu se acalmar. Foi até a cozinha e encheu um copo de água. Quando foi
levá-lo à boca, porém, não era mais água que via, mas um espesso líquido
avermelhado que se assemelhava a sangue. Assustado, Jim largou o copo e viu o
vidro se estraçalhar no chão. Porém, não havia sangue nenhum no piso, apenas
água. Atordoado, Jim resolveu procurar um calmante, deitou-se na cama e caiu no
sono.
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Quando acordou, Jim sentia-se muito mal. A noite inteira
teve pesadelos sobre os desenhos; via o deus maligno estraçalhar o corpo da
deusa das formas mais variadas. Não entedia por que os desenhos o abalavam
tanto.
Decidido a por um fim naquele episódio e esquecer tudo
aquilo, Jim pôs-se às suas atividades diárias. Apesar disso, parecia que ele
estava destinado a ter um dia muito ruim.
Ele começou com um café da manhã sem gosto. Depois tentou
trabalhar no projeto para o seu cliente importante, mas parecia que o trabalho
não rendia e a qualidade estava bem abaixo do que ele estava acostumado. No
final da tarde, ele havia desistido. Para não ter o dia perdido, resolveu que
apenas relaxaria à noite, faria um bom jantar, abriria uma garrafa de vinho e
escutaria uma boa música para relaxar.
Jim saiu de casa e foi até o açougue, decidiu comprar um bom
corte de carne de primeira e voltou para preparar o seu jantar. Já na
cozinha, foi pegando os utensílios e temperos, mas teve que parar um momento, pois
começou a sentir um cheiro muito estranho. Rapidamente, o odor se alastrou pela
cozinha toda e Jim mal podia respirar. Parecia que havia algo estragado. O
jovem tentou localizar a fonte do cheiro e chegou à conclusão de que ele vinha
do pacote de carne. Ao abri-lo, arrependeu-se de fazê-lo. Um odor ainda mais
forte de comida apodrecida se espalhou pelo ambiente, e não era só isso que
desagradou o jovem, várias larvas brancas rastejavam pela carne. O primeiro
pensamento de Jim foi jogar o pacote fora, mas logo mudou de ideia. Furioso,
Jim saiu de casa e levou a carne estragada de volta ao açougue.
O lugar já estava deserto e o dono estava prestes a fechar o
estabelecimento.
- O senhor não tem vergonha de me vender carne podre?! – Jim
esbravejou.
- Como é que é? – o velho açougueiro não entendia a
acusação.
- Olha essa carne – Jim colocou o pacote na bancada.
O açougueiro abriu o pacote, ressabiado, deu uma olhada, e
voltou a encarar o jovem com ar de reprovação – Não há nada de errado com essa
carne.
- Como não? – Jim abriu o pacote com violência e revelou o
que continha.
- Vê, não tem nada de errado – o açougueiro disse.
A carne parecia saudável.
- Não pode ser... Eu vi larvas e tudo mais nela – Jim
revirou a carne com os dedos, mas por todos os lados ela parecia completamente
normal.
- Rapaz, eu estou cansado, você vai ficar aqui me fazendo
perder tempo?
Jim não entendia o que estava acontecendo, ele havia visto
claramente o estado da carne quando estava em casa. – O senhor me desculpe,
acho que não estou bem. – Deixando a carne lá mesmo no açougue, o ilustrador
voltou para casa. Chegando, resolveu que não comeria nada e foi para a cama
mais cedo.
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Jim acordou assustado no meio da noite, tivera sonhos
estranhos mais uma vez. Quando se deu conta, não estava na cama como esperava,
e sim, debruçado em sua mesa de trabalho. Estranhamente, percebeu que havia
feito novos desenhos... enquanto dormia.
- Não é possível...
O jovem nunca desconfiou de sonambulismo, mas estavam lá no
papel, coisas que ele nem se lembrava de ter feito. Decidiu se afastar do
local. Não entendia o porquê de estar tão transtornado naquele dia.
Tentou refletir no que havia acontecido na sua vida nos
últimos tempos, mas nada justificava uma mudança tão repentina de seu humor.
Sem saber o que fazer, voltou para a cama para dormir. Quem sabe aquele havia
sido apenas um dia atípico, o próximo com certeza seria melhor.
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Jim acordou com a boca seca e uma sensação de pavor. Sentia
muito frio, embora o termômetro do relógio digital indicasse temperatura
agradável. O jovem levantou-se da cama e preparou-se para sair. Aquele seria um
dia importante, ele teria uma reunião na empresa do seu cliente e mostraria o
andamento de seu trabalho. Enquanto arrumava o material para a apresentação,
Jim não pôde deixar de reparar que o ar ganhara um cheiro extremamente ruim. O
ilustrador procurou a fonte de tal odor putrefato, mas não conseguiu achar de
onde ele vinha. Quando viu que já estava ficando tarde, desistiu de procurar,
pegou suas coisas e saiu.
Quando estava nas ruas, reparou que havia uma incomum
comoção nas vizinhanças. Algumas viaturas policiais bloqueavam uma rua próxima
e uma multidão estava no local.
- O que está acontecendo? – Jim perguntou a um conhecido,
por curiosidade.
- Uma coisa feia, encontraram o seu Ezequiel morto. Dizem
que levou tanta facada que estava irreconhecível.
Jim sentiu um frio na espinha. Lembrou-se da discussão que
tiveram na noite anterior e se sentiu culpado. Afinal de contas, o velho
açougueiro não tinha feito nada. O ilustrador, porém, não tinha nada a ver com
a morte e não podia fazer nada a respeito. Ainda tinha coisas importantes para
fazer, então seguiu em seu caminho.
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No final da tarde, Jim voltava da reunião. Não havia ocorrido
nenhum imprevisto. Tudo certo, o cliente estava gostando do andamento do
trabalho, ele só precisava voltar para a casa e continuar com o projeto. Quando
estava alcançando o portão, porém, sentiu uma forte corrente de água atingi-lo
em cheio.
- Ai, moço, você me desculpe! – disse sua vizinha com uma
expressão de culpa no rosto e uma mangueira na mão.
- Não foi nada... – Jim tentou acalmar a velha senhora.
Havia sido apenas água... No entanto, ele percebeu que a pasta que levava com
seus trabalhos também havia sido atingida.
- Você está bem? – a senhora perguntou quando viu o olhar de
aflição no rosto do rapaz.
Jim não respondeu e apenas entrou correndo em sua casa.
Quando abriu a pasta, viu que a água havia se infiltrado pelas frestas e
molhado parte do seu trabalho. Ele começou a separar as folhas e analisar o
estrago, e foi com alívio que viu que não estava tudo perdido. Aparentemente,
apenas as bordas haviam sido molhadas e quando elas secassem, ele poderia
aproveitar o resto do desenho. Felizmente, não era seu trabalho finalizado, era
somente o esboço. Curiosamente, alguns respingos de água haviam atingido
algumas partes do meio das folhas, nos rostos das pessoas, dando a impressão de
que elas haviam chorado.
Cuidadosamente, Jim pendurou as folhas para secarem em um
varal improvisado na sala e preparou seu jantar normalmente. Não houve nenhum
imprevisto até o fim do dia, e o jovem ilustrador foi dormir com a certeza de
que o que o que havia acontecido anteriormente, foi apenas um corriqueiro dia
ruim.
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Jim acordou com batidas na porta. Ainda sonolento, caminhou
até a entrada da casa e foi ver quem era a pessoa que batia tão insistentemente.
Era um homem de cabelos castanhos curtos, que aparentava ter 35 anos, vestido
com um sobretudo marrom sobre um terno preto.
- Bom dia, meu nome é Rick Cambiaso, sou investigador de
policia. Posso fazer algumas perguntas?
O ilustrador logo se lembrou do açougueiro que havia morrido
e uma estranha sensação de desconforto surgiu. Como não tinha nada a ver com o
caso, também não tinha nada a temer - ele quis acreditar.
- Você quer entrar? – Jim reparou que havia vários policiais
e viaturas em sua rua.
- Não precisa, mas se você tiver uma xícara de café, eu
aceito – o investigador sorriu.
Jim deixou o homem entrar em sua casa e foi preparar o café.
- Você não está curioso? – perguntou Rick.
- Eu? – Jim perguntou.
- Em saber por que eu estou aqui – o investigador perguntou
de modo descontraído, mas o ilustrador sentia algo mais na pergunta.
- Ah, sim, o que está acontecendo? – Jim perguntou
calmamente. - Eu vi um monte de gente lá fora.
- Sua vizinha aqui do lado, a dona Rosa, foi encontrada
morta.
Aquilo realmente surpreendeu o ilustrador. – Como foi isso?
- Parece que o filho deu uma passada hoje de manhã e já
encontrou ela sem vida.
- E não foi morte natural? – Jim podia dizer pela comoção
causada.
- Eu duvido – Rick disse.
Jim passou a xícara de café para o investigador.
- Por acaso, você não ouviu nada de estranho esta noite? –
Rick perguntou.
- Não ouvi nada.
- Nada suspeito?
- Parecia tudo normal quando eu cheguei, eu a vi lavando o
quintal e depois entrei em casa. Não vi nem ouvi nada de estranho depois.
- Você desenha? – Rick perguntou ao ver as folhas penduradas
perto das janelas.
- Eu sou ilustrador.
- Ah – Foi apenas o que Rick disse antes de terminar o café.
– Se você se lembrar de algo – O investigador entregou um cartão. – Qualquer
coisa, não se esqueça de me ligar. – Rick foi até a porta. – Ah, e obrigado
pelo café – disse antes de fechar a porta e sair.
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Jim estava tendo um sono agitado. Mais uma vez via imagens
sangrentas. Ora elas eram rápidas e confusas, ora eram lentas e detalhadas. Em
seu pesadelo, Jim pôde ver com detalhes o corpo do açougueiro ser esfaqueado várias
vezes no estômago, até sua pele se romper, derramando suas vísceras no chão do
açougue. Jim também pôde ver a sua vizinha deitada em sua cama, estrangulada
até a morte, até sua face paralisar em uma expressão de puro horror.
- “..................................................Jim.”
– uma voz o chamava.
Lentamente, o jovem abriu seus olhos e viu que a luminária
de sua mesa de trabalho estava mais uma vez acesa. Sabendo que não conseguiria
dormir até ver o que era, o ilustrador caminhou até o local e sentou-se. Pegou
o primeiro lápis que viu pela frente e começou a rabiscar uma folha em branco.
Quando se deu conta, havia terminado. Mais uma vez aquele deus de cabelos
arroxeados estava no papel. De repente, algumas palavras surgiram em um espaço
de folha que antes estava em branco, tornando-se mais e mais escuras, até que
Jim pôde ler o que estava escrito.
“Não era isso que você
queria?” Era como se o deus perguntasse.
- Isso o quê? – Jim perguntou.
Apenas uma risada foi ouvida, algo que parecia que não havia
sido no quarto, mas dentro da mente do rapaz. Jim respirou fundo e apagou a
luminária, voltou para a cama e deitou-se sem mais nenhuma pergunta.
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No dia seguinte, Jim acordou normalmente e tomou seu café da
manhã. Parecia que tudo havia finalmente voltado ao normal. No final da manhã,
começou a trabalhar no seu projeto, e continuou assim até o começo da tarde,
quando foi interrompido por uma ligação. Jim atendeu o celular e não acreditou
nas palavras que ouviu.
- Como assim vocês estão cancelando o projeto? – Jim não
podia entender, tudo estava indo bem, o cliente havia gostado da ideia. Como
era possível que eles simplesmente estavam desistindo de algo que estava sendo
planejado há tanto tempo. – E todo o trabalho que eu fiz até agora?
O jovem não acreditava que havia perdido uma chance
daquelas. Se tudo tivesse dado certo, seu trabalho receberia grande
visibilidade e finalmente ele poderia ter seu nome consagrado.
Não demorou muito para que Jim pegasse suas coisas e saísse,
ele precisava de uma boa explicação para tudo aquilo.
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O jovem voltou para casa abalado, foi à empresa e tentou
conversar, entender melhor os motivos e quem sabe entrar em um melhor acordo, mas
a recepção calorosa de outrora deu lugar a frias desculpas.
Jim estava convencido a abrir a garrafa de Uísque que estava
guardada e afogar suas mágoas na bebida, não sabia mais o que fazer para
esquecer. Quando foi pegar a garrafa na cozinha, porém, notou um estranho som.
O jovem voltou para a sala e viu que a TV estava acesa. Jim não se lembrava de
tê-la ligado. Sua atenção se voltou para o programa que passava. Era um
noticiário, parecia que havia algo acontecendo no momento. Havia uma repórter
relatando que estava no local de um grave acidente de trânsito. Um carro
desgovernado havia atingido um homem. A repórter relatava que haviam acabado de
identificar a vítima. Jim conhecia bem quem era... Havia se encontrado com ele
naquele mesmo dia. Era seu ex-cliente, Oliver Marshall.
Logo após a notícia o rapaz sentiu seu estômago se revirar e
correu para o banheiro. Ele abriu a tampa da privada e começou a vomitar. O que
ele via sair de sua boca, porém, era bem diferente do que ele podia imaginar.
Era como se estivesse vomitando um pó acinzentado, que ele identificou como
grafite. Quando finalmente conseguiu parar, horrorizado, percebeu que não havia
nada além de água na privada. Ele havia imaginado tudo aquilo.
Lentamente sua pressão foi voltando ao normal e os tremores
que estava tendo enquanto passava mal cessaram.
Jim juntou suas forças e voltou para a sala. A TV estava
desligada. Teria ele imaginado tudo aquilo? O jovem estava realmente
questionando sua sanidade. Ele não entendia. Nada daquilo fazia sentido. O
ilustrador nunca em sua vida tivera episódios como aqueles. Procurando se
acalmar, resolveu não tomar o Uísque. Tentou comer algo saudável no jantar e
foi dormir cedo. Tomou um calmante e logo depois se viu cair no sono.
xxx
O jovem escutava um som leve e continuo e, ainda com os
olhos fechados, tentava descobrir o que era. Foi quando algo molhado caiu em
sua face que ele finalmente se viu totalmente acordado. Havia sido alguma coisa,
como uma gota, mas o jovem tinha certeza que não havia goteiras no seu quarto.
Quando olhou para o teto, não viu nada, porém, quando olhou para o colchão, viu
que havia uma pequena poça de um líquido vermelho. De tempos em tempos uma
gotinha caía e se acumulava numa dobra de seu lençol. Jim mais uma vez olhou
para cima e não viu sinal nenhum de rachadura ou buraco, ficou perplexo ao
notar que, mesmo assim, as gotas vermelhas continuavam caindo. Ele tocou o
líquido com curiosidade e viu que seu dedo se tingia de vermelho.
- O que é isso? - ele perguntou, mais para si mesmo.
“Isso é sangue” –
uma voz respondeu.
Jim quase deu um pulo ao ouvir aquilo. Era a mesma voz que
ele havia escutado na noite anterior, mas dessa vez ela parecia ressoar por
todo o quarto. O jovem se encolheu num canto da cama e olhou ao redor, não
parecia ter nada nem ninguém... mas então de onde viria aquela voz?
“Você sabe”.
Jim começou a tremer e a suar frio, aquela voz parecia muito
real para ser imaginação.
“Não tenha medo. Só
fiz o que foi melhor para você.”
- Fez o quê? – Jim não sabia de onde tirou forças para
perguntar.
“Você sabe.”
- Você matou aquelas pessoas?
Nenhuma resposta. Jim, porém, sabia onde procurá-las. Tomado
por uma coragem momentânea, o jovem foi até sua mesa de trabalho e começou a
desenhar. Foi então que viu sua própria mão colocar no papel as imagens que
apenas havia visto em seu sonho. Viu o açougueiro esfaqueado e a vizinha
estrangulada. No entanto, também viu uma imagem que era nova. Viu o corpo do
seu cliente ser feito em pedaços pelo veículo que o atingiu. E tudo se tornava mais
vívido com os pingos de sangue que caiam sobre as folhas enquanto Jim
desenhava.
- Quem é você? – Jim logo se viu traçando as formas do deus
que havia criado.
“Eu sou o deus da
destruição e do caos.” As palavras surgiram no papel.
- Por que está fazendo isso? – Jim perguntou.
Mais uma vez, palavras começaram a surgir.
“Por que você quis.”
- Eu não queria que nenhum deles morresse!
“Não queria?”- Um
riso ressoou pelo quarto.
- Eu juro que não queria!
“Nem aquele seu
cliente que dispensou você?”
- Nem ele! Por que eu iria querer isso?!
“Não se sente mais
aliviado? Agora você terá mais tempo de se dedicar só a minha história. Eu
prometo a você, quando tudo estiver terminado, você será reconhecido
mundialmente.”
- Eu não acredito nas suas promessas! E sabe de uma coisa? –
Jim estava tomado por um momento de revolta e juntou toda a sua coragem para a
ideia genial que veio em sua mente. – Eu criei você, agora posso me desfazer de
você! – Jim pegou uma borracha e começou a apagar ferozmente a folha de papel.
“Você não vai
conseguir.”
Jim via a face do deus desfigurada pelos golpes de sua
borracha. – É o que você pensa! – Num outro momento de desespero e bravura, Jim
pegou um isqueiro e segurou o papel. – Adeus.
A folha começou a queimar, a diminuir e se transformar em cinzas.
Uma a uma, elas foram sendo queimadas. Jim ainda titubeou ao ver seu primeiro
desenho da série, a deusa de luz que havia criado, mas mesmo assim, ateou fogo
em sua obra mais bonita. Ao final, Jim se sentia aliviado. Acreditava que
finalmente havia dado um fim naquilo tudo. Foi quando escutou aquele riso mais
uma vez e se viu de repente na cama.
Era como se Jim tivesse despertado de um vívido sonho,
embora ele tivesse certeza de que tudo o que passara havia ocorrido. Mais uma
vez, ele levantou e caminhou até sua mesa de trabalho. Os desenhos estavam
todos lá.
Jim levou suas mãos aos cabelos e os puxou em nervosismo,
dando um grito de frustração. Decidido a por um fim naquilo mais uma vez, ele
pegou as folhas com as ilustrações e tentou rasgá-las, porém, antes que ele
cumprisse seu intento, uma força o obrigou a soltá-las e ele foi derrubado no
chão. Ainda desnorteado, sentiu que seu quarto começava a tremer. Jim procurou
algo para segurar, mas não conseguiu, era sempre puxado de volta para o centro
do quarto.
Paredes, teto e chão chacoalhavam como em um terremoto e um
pó acinzentado começou a se materializar no ar. As partículas finas começaram a
subir pelas paredes, até formarem desenhos na superfície branca. Jim pôde ver
algumas curvas se formarem e então o contorno de serpentes se tornando cada vez
mais claro. Os desenhos rastejavam pelas paredes como se estivessem vivos, e
foram ganhando mais e mais definição, até elas se soltarem da superfície lisa.
Jim estava cercado por cabeças de serpente que o rodeavam, espreitando-o com
olhos maliciosos e mandíbulas abertas.
“Você ainda ousa me
desafiar?”
Jim ouviu a voz retumbante do deus do caos.
- Você não existe! Seu poder é apenas uma ilusão! – Jim o
desafiou.
“Tem certeza?”
As serpentes chegaram mais e mais perto, balançando seus
corpos como se quisessem hipnotizar sua vitima antes do bote. Então o quarto
começou a tremer mais e mais e uma chuva de grafite caiu sobre ele. Jim podia
sentir os finos grãos em contato com sua pele, como se eles fossem mesmo reais.
Ele os esfregou em seus dedos e viu suas digitais serem tingidas pelo pó
cinzento.
- É real.
Foi então que uma das serpentes parou de se mover por um
breve momento, até jogar seu corpo gigantesco na direção do ilustrador. Jim
conseguiu se desviar por pouco, rolando seu corpo pelo chão. Sua cabeça acabou
batendo em uma mesa com o movimento; o baque, além de causar-lhe uma pontada de
dor, fez com que alguns objetos que estavam em cima da superfície de madeira
caíssem no chão. Quando Jim se deu conta, um desses objetos era seu celular e
outro o cartão de visitas que o investigador da policia havia dado. Pedir
socorro não parecia uma ideia tão ruim naquele momento e apressadamente o
ilustrador discou o número do cartão. A chamada demorou a ser atendida, mas
após a segunda tentativa uma voz sonolenta atendeu.
- É bom ser algo
importante – disse o investigador no outro lado da linha.
- O assassino da senhora Carbone está aqui – foi a última
coisa que Jim teve tempo de dizer antes que uma das cabeças da serpente o
atingisse em cheio com sua mordida.
xxx
-Ei.
Jim escutava uma voz.
- Você está me ouvindo?
O ilustrador finalmente recuperou os sentidos e deu de cara
com o investigador da polícia.
- Eu já ia pegar um balde de água para jogar em você. Precisa
de ajuda? – Rick estendeu-lhe a mão.
Jim decidiu aceitar a ajuda para levantar.
- O que aconteceu por aqui? – Rick perguntou. – Parece que
houve algum tipo de briga. – O quarto estava todo em desalinho, com objetos
jogados ao chão e móveis fora do lugar. – Só que não vi sinal algum de outra
pessoa ou de arrombamento, você poderia me explicar?
Jim sentia sua cabeça latejar. Fora a desordem do quarto,
tudo parecia ter voltado ao normal. Não havia desenho nenhum nas paredes. Ele
não sabia como explicar a situação.
- Quando você chegou... – Jim começou. – Não havia nada de
anormal?
- Fora a bagunça, nada.
- Eu não sei como dizer isso, mas sei quem foi responsável
pela morte da dona Rosa, e sei quem foi o responsável pela morte de mais outras
duas pessoas pelo menos.
Rick arqueou uma sobrancelha. – É mesmo? Então diga.
- Só que você não vai acreditar – Jim desabafou.
- Durante toda a minha carreira eu vi coisas inacreditáveis.
- Eu criei um monstro.
- Um monstro? Que tipo de monstro?
- Aquele desenhado naquelas folhas de papel. – Jim apontou
para a sua mesa de trabalho.
Desconfiado, Rick caminhou até o local e verificou cada
folha. – Não vejo nada de mais aqui.
Jim foi até sua mesa. – Espera um momento... Isso não estava assim antes. – Jim notou que o
deus continuava ali, mas as palavras que surgiram no papel enquanto ele falava
haviam sumido.
Rick pôs a mão no ombro de Jim. – Há alguma outra coisa que
você quer me falar, você precisa de alguma outra ajuda...
- Como assim? – Jim perguntou sem entender.
- Você tem família ou amigos a quem possa recorrer?
- Tenho.
- Você é dependente de algum tipo...
- Eu não uso drogas, eu só bebo muito de vez em quando – Jim
estava ficando nervoso.
- Eu vi alguns calmantes...
- Eu quase nunca tomo eles... – Jim tentava se explicar. - Você
revistou minha casa?
- Você me chamou dizendo que o assassino estava aqui. Eu fiz
uma revista.
- Você deve achar que sou louco agora...
- Todos nós temos algum tipo de problema... Se quiser, tem
um amigo que pode conversar com você, talvez seja bom se consultar com ele,
dizem que ele é um ótimo psiquiatra.
- Você está dizendo que eu sou louco?
Rick ficou olhando para o rapaz mais jovem por um momento,
até finalmente dizer. – Como eu disse, é normal que algumas pessoas tenham
algum... problema.
Jim segurou os ombros de Rick e o encarou. – Eu não sou
louco, entende? Eu não sou.
- Eu acredito, mas talvez você precise de ajuda.
- Eu preciso de ajuda, mas para por um fim em todas essas
mortes!
- Mais de uma, você disse.
- Sim, mais de uma.
- Conte sua história. – Rick olhou para as horas em seu
celular. – São 5h20 da manhã agora e acho que não tenho nenhum lugar para ir no
momento... Eu só gostaria de pedir uma xícara de café...
xxx
- Resumindo a história, você quer dizer que seu desenho
ganhou vida e está saindo por aí mantando pessoas? – o investigador perguntou
com tranquilidade.
- Você não acredita, não é?
- Você vai concordar comigo que é uma história difícil de
acreditar...
- Eu não devia ter contado para você. Mais do que nunca,
agora você deve achar que eu sou doente.
- Eu quero acreditar em você, mas você não está tornando as
coisas fáceis para mim...
Foi então, que Jim teve uma ideia. – Você poderia ficar uma
noite aqui, ver com seus próprios olhos. Essa... coisa que eu criei precisa ser
parada.
- E você quer que eu traga reforços policiais?
- Se possível... – Jim olhou bem para a cara do
investigador. – Mas você não vai fazer isso... É claro que não...
- Já enfrentei coisas muito piores, acho que eu dou conta de
alguns desenhos.
- Você não está levando isso a sério... mas tudo bem, eu
entendo.
- Pode deixar, eu volto aqui hoje à noite. – Rick deus uns
tapinhas amigáveis nas costas de Jim. – Não se preocupe, resolvemos isso hoje.
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Jim havia passado o dia fora, não suportaria a ideia de
permanecer em sua casa sozinho. Tentou passar seu tempo relaxando. Foi a um
museu ver uma nova exposição, depois foi ao cinema e, por fim, passou em um
mercado para comprar algumas coisas para passar a noite. Tudo correra bem e sem
imprevistos e Jim quase se esqueceu das coisas estranhas que estavam
acontecendo. Quando se aproximava de sua casa, porém, começou a sofrer de
ansiedade. Seus músculos ficavam mais tensos a cada passo e ele começou a suar
frio. Para seu alívio, Rick estava esperando do lado de fora do seu portão.
- Faz muito tempo que você está aqui?
- Um pouco – Rick deu de ombros.
Jim abriu o portão de sua casa e deixou o investigador
entrar.
- Eu trouxe um macarrão do supermercado, tá a fim de comer?
Eu posso pedir uma pizza também.
- Qualquer coisa – Rick disse enquanto se sentava à mesa da
cozinha.
Jim pegou os pratos e deixou o macarrão na mesa.
- Tem cerveja? – Rick perguntou.
- Tem. – Jim abriu a geladeira e pegou duas latas. – Tem
mais aqui se quiser.
- Pode deixar – Rick disse ao se servir. – Tem queijo
também?
- Acho que tem – Jim deu uma procurada em sua cozinha por parmesão
ralado e encontrou um pacote.
Rick pegou o queijo e polvilhou seu macarrão com ele.
Jim sentou-se e se serviu.
- Eu queria agradecer por você ter concordado em ficar aqui.
Eu sei que...
- Não precisa dizer nada – Rick disse enquanto continuava
comendo normalmente.
Após o jantar, os dois já estavam preparados para enfrentar
o que a noite os reservava.
- Pode ficar com a cama – Jim disse quando entraram no
quarto.
- Não precisa, vou ficar na poltrona assistindo o jogo, se
não se importar.
- Pode ficar.
Rick pegou o controle remoto, sentou-se na poltrona e
acendeu a televisão. – Tem como pegar uma cerveja para mim?
Jim foi até a cozinha e voltou com duas latas de cerveja. –
Se quiser mais pode pegar lá. – Ele viu que Rick já estava entretido no jogo.
Sem saber o que fazer, Jim resolveu ligar seu computador e ficar vendo coisas
aleatórias na internet.
As horas se passaram e quando Jim notou, já era mais de
meia-noite. O jogo havia acabado e Rick estava dormindo na poltrona. Ele
continuou por mais uma hora na internet, mas viu que o sono estava vindo. Após
um longo bocejo, ele desligou o computador e foi até a cama. Resolveu deixar
apenas a luminária de sua mesa de trabalho acesa e desligou as outras.
Aparentemente, sua criatura maligna não estava a fim de
aparecer naquela noite. Quando estava prestes a dormir, porém, começou a
escutar um barulho, um leve ruído. Abriu seus olhos lentamente e procurou pela
fonte daquele estranho som. Viu que algo parecia estar brotando das folhas de
papel na mesa.
A princípio, não dava para definir direito o que era, mas
depois conseguiu ver que pequenas partículas de grafite estavam saltitando e
ganhando forma. Quando percebeu isso, todos os seus instintos de alerta foram
despertados.
- Acorda, Rick – Jim chamou, mas o investigador continuava
dormindo. – Rick! – o ilustrador chamou mais uma vez.
Jim saltou da cama e correu na direção do investigador,
porém, algo o impediu. A criatura maligna começou a sair das
folhas, como se estivesse emergindo após um mergulho; seu tamanho aumentava à
medida que ele saia. Quando estava finalmente livre, caminhou até o meio do
quarto, envolto de um turbilhão de grafite. Fora do limite do papel, o ser
maligno tinha um tamanho impressionante. Parecia ter mais de 2 metros e meio.
Ainda parecia com uma ilustração viva, o mesmo estilo de pintura oriental, os
mesmos traços.
- “Você pensou que
estava livre de mim?” – a criatura disse com sua voz sobrenatural,
melodiosa e enigmática, que ressoava por todo o quarto.
Jim, estupefato, viu-se frente a frente com sua criação. Os
olhos sobrenaturais olhavam fixamente para ele. Em seguida, Jim viu o ser
maligno se voltar a Rick e levantá-lo pelo pescoço com apenas uma das mãos, como
se o investigador não tivesse peso algum.
- Por favor, não faça nada com ele! Ele não fez nada!
O deus do caos levou o corpo suspenso no ar e empurrou a
cabeça do investigador contra a parede; o som do baque gerou um pavoroso estrondo.
- Por favor, pare! – Jim assistia à cena horrorizado. O ser
continuava golpeando a cabeça do investigador contra a parede, até a pele e o
crânio começarem a ceder.
Quando o deus do caos finalmente terminou, a parede estava
tingida de sangue e pedaços de cérebro. A cabeça do investigador estava
irreconhecível, completamente esmagada. O deus largou o corpo no chão e se
voltou novamente para o ilustrador. – “Agora,
o que farei com você?”
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Jim acordou com um grito. Olhou ao redor, assustado, e viu
que estava deitado no chão.
- Parece que não dormiu bem... – disse uma voz conhecida.
O ilustrador ficou aliviado ao perceber que Rick ainda
estava vivo. Jim começou a rir – Você não sabe como eu fico feliz em ver você!
- É mesmo? – Rick perguntou, havia algo de diferente na
expressão do investigador.
Antes que Jim pudesse responder, alguns homens da polícia
entraram no quarto.
- Podem prendê-lo – Rick deu a instrução.
- Mas o que está havendo? –Jim se viu algemado e levado para
fora de sua casa.
- Você tem o direito de permanecer calado. Tudo o que disser
poderá ser usado contra você – Rick deu uma risada zombeteira. – Não é algo
assim que dizem nos filmes? Acho que é isso.
- Eu não fiz nada! – Jim protestou.
- Todos dizem a mesma coisa. - Rick colocou as mãos nos
ombros do ilustrador e olhou para ele. – Quer um conselho? Não diga mais nada.
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Jim tentava entender o que acontecera. Ele sabia que havia
agido de maneira suspeita, mas não havia nada que o incriminasse, ele não havia
feito nada. Em dado momento, ele viu o guarda abrir o portão de sua cela e teve
esperanças de que o engano tivesse sido esclarecido. Ele andou pelos corredores
da delegacia e foi levado a uma sala, onde encontrou Rick sentado atrás de uma
mesa de escritório.
- Por favor, sente-se – Rick disse após dar um gole em seu
café.
- Você não vai mandar me soltar? – Jim levantou os braços e
mostrou as algemas.
- Você promete cooperar?
Jim balançou a cabeça de maneira afirmativa.
Rick fez um gesto para o policial, que retirou as algemas.
- Diga que isso não é verdade, que não passou de um mal
entendido... – Jim ainda tinha esperanças.
- Sabe de uma coisa? – O investigador deixou seu café na
mesa, reclinou seu corpo na poltrona e olhou fixamente para o rapaz. – Eu
realmente queria acreditar que você era inocente.
- Mas eu sou inocente! – Jim esbravejou.
Rick fez sinal para que o ilustrador se silenciasse. – Você
prometeu se comportar.
Jim murmurou uma série de xingamentos, mas voltou a ficar
quieto logo depois.
- Eu gostaria que isso não tivesse acontecido, Jim, você
parecia um cara legal, mas as provas vão todas contra você.
- Que provas? Não existem provas, eu não fiz nada!
- Você matou aquelas três pessoas. Ezequiel Zarco, Rosa
Carbone e Oliver Marshall.
- Eu não matei!
- Você pode continuar negando, mas há evidências suficientes.
Quando eu vi você pela primeira vez, eu realmente não desconfiava que você
tivesse feito aquilo. Só estava atrás de alguma pista que pudesse me ajudar... mas
você não só deu a pista, praticamente se entregou... Talvez seja culpa, eu
entendo...
- Como assim, eu me entreguei?
- Quando entrei para investigar a morte da senhora Carbone,
notei que havia marcas de um pó acinzentado no chão e ao redor do corpo. Graças
ao seu convite à sua casa, pude colher material para comparar com os da casa da
sua vizinha, e descobri que era o mesmo tipo de grafite. Como você mencionou a
morte do açougueiro, fiz uma nova busca no local, e encontrei amostras do mesmo
grafite que você usa. Além disso, você havia mencionado seu cliente. E não é
que recebemos as filmagens de uma câmera de segurança em um prédio vizinho ao
do escritório dele, adivinha quem estava lá?
- Eu realmente fui a o escritório dele, mas eu não o matei,
isso você não tem como provar!
- Sinto lhe informar que tenho. A câmera mostrou você
seguindo o Oliver e depois empurrando ele na rua quando pensou que ninguém
estava vendo.
- Não pode ser! Deve ter sido outra pessoa! Eu não fiz isso.
- Foi encontrado um fio de cabelo seu no paletó que Oliver
Marshal usava. Além disso, a faca que matou o Ezequiel Zarco havia sumido, mas
foi encontrada em um terreno baldio perto da sua casa. Ela tem suas digitais.
- Isso não é possível, alguém está tentando me incriminar!
- Aquele desenho seu? Foi ele que fez tudo isso?
Jim apenas olhou para Rick.
- Não fique tão alarmado, eu sei que você vai ter um
comportamento exemplar na prisão. Eu realmente não acho que você seja um cara
de todo ruim, mas você precisa pagar de alguma forma pelos crimes que cometeu.
- Por favor, eu sou inocente.
- Isso quem vai decidir agora é o júri. – Rick chamou o
guarda, que entrou na sala e algemou o ilustrador novamente.
- Por favor... – Jim olhou mais uma vez para o investigador,
antes de ser levado de volta para a sua cela.
- Não posso fazer mais nada por você – Rick disse para o
vazio da sala, antes de tomar o último gole de seu café.
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“É uma pena, podíamos
ter construído uma história bem diferente juntos, mas você não quis.”
Lentamente, os desenhos nas folhas foram se apagando, as
cores e o grafite foram se desfazendo, até que apenas restassem papéis em
branco.
FIM
Nota: Não
utilizei referências diretas à mitologia japonesa, mas me inspirei vagamente
nas figuras de Amaterasu e Susanoo. O deus das tormentas me deu a impressão de
gostar de criar confusões, por isso, resolvi me inspirar nele para criar minha
criatura caótica e maldosa. As serpentes que aparecem em uma cena são
referências à luta de Susanoo contra a hydra.
Nota 2: Se quiserem, podem avisar se encontrarem algum erro. Por mais que eu revise os textos 5, 10, 20 vezes, sempre acho alguma coisa que escapa...
Nota 2: Se quiserem, podem avisar se encontrarem algum erro. Por mais que eu revise os textos 5, 10, 20 vezes, sempre acho alguma coisa que escapa...